Eu sempre fui um fã de Lego!
Lembro até hoje do primeiro kit que eu comprei, por volta dos 10 anos, de uma nave espacial da Nasa! Eu não tenho mais ele aqui comigo, mas nem preciso fechar os olhos para ver a sua imagem.
Mas foi só uns dois ou três anos atrás que eu tive meu primeiro contato com o método Lego® Serious Play®. E o primeiro vislumbre de como seria utilizar um brinquedo / jogo que eu tanto amo para trabalhar. E foi assim que entrei na jornada de me tornar um facilitador dessa metodologia.
Algo que percebi na minha formação é que a pegada do método era um pouco diferente do que eu imaginava. O Lego tem muitas peças, encaixes e possibilidades. É uma verdadeira engenharia. E eu achava que o LSP tinha a ver com isso. Mas era algo diferente, muito mais profundo.
Posso voltar a esse aspecto em um outro artigo, mas hoje a ideia é comentar aqui como eu percebi uma ótima aplicação para o LSP. Uma das minhas preocupações ao encarar esse desafio era de como o Lego poderia ser realmente útil no dia a dia de trabalho, e um dos primeiros paralelos que eu fiz foi com o Guia do Pensamento Complexo do Management 3.0.
Para quem não sabe, uma das bases do Management 3.0 trata de como lidar com ambientes complexos e incertos. Eu costumo dizer que é essencial para a compreensão desse moderno modelo de gestão. Tanto que foi o que eu levei quando me pediram uma contribuição no artigo Por que o Management 3.0 é essencial para Agile Coaches.
O Management 3.0 é baseado no pensamento complexo e na gestão e liderança, dois temas essenciais para atuar como Agile Coach. A base do Management 3.0 nos ajuda a entender diversos frameworks e ferramentas ágeis como Scrum, Design Thinking e até Kanban.
Então vamos lá! Como lidar com a complexidade e incerteza usando Lego e inspirado pelo Management 3.0? Primeiro vale dizer que o Management 3.0 sugere 8 diretrizes guia para lidar com isso, já que não existe uma fórmula pronta ou receita.
Eu vou explorar cada uma delas e sua relação com o Lego. Você vai aprender mais sobre o mundo Lego e de cara se aprofundar em um importante conceito do Management 3.0.
Não há leis para lidar com mudanças, incertezas e complexidade
(O melhor que podemos fazer é seguir estas 8 diretrizes)
A primeira diretriz é uma que vejo mais dificuldade das pessoas aplicarem, e acho que é onde o Lego tem o seu ponto mais forte.
Quando estamos diante de um problema complexo, utilizar metáforas, histórias e coisas visuais ajuda o nosso cérebro a compreender melhor o problema e tratá-lo de maneira mais efetiva.
Quando dizemos que um gestor precisa atuar como um jardineiro, estamos usando uma metáfora que ajuda a compreender esse complexo papel que é a gestão moderna.
No desafio que damos sobre pensamento complexo no Workshop Foundation do Management 3.0, esse é um dos aspectos que acaba sendo menos explorado, é muito raro algum grupo trazer uma metáfora ou algo nesse sentido.
O Lego Serious Play é, principalmente, uma ferramenta onde construímos metáforas através de modelos, e contamos histórias sobre esse modelo. Além, é claro, de ser totalmente visual.
A primeira etapa de um workshop LSP trata exatamente de ensinar os participantes a se comunicar em 3D, usando peças, modelos, metáforas e histórias.
Ou seja, toda a metodologia acaba sendo inspirada por essa diretriz, já que é um constante trabalho de metáforas e histórias para compreender melhor todos os meandros de um sistema complexo.
O modelo acima, que eu elaborei durante a minha formação LSP, mostra o meu momento profissional atual. Poder compartilhar isso com o grupo apoiado por esse modelo fica muito mais rico do que simplesmente sair falando sobre. Todos podem visualizar o que está sendo dito, e muitas coisas podem emergir pela exploração do modelo.
Uma ótima maneira de iniciar um trabalho de Team Building ou de resolução de problemas em grupo.
Cada indivíduo tem uma visão diferente sobre algo complexo. Coletar diversos pontos de vista ajuda a ter uma melhor visão do que acontece, permitindo melhores e mais criativas soluções e removendo muitos viéses.
Aqui o ponto do Lego Serious Play é que ele não só auxilia a ver as diversas perspectivas como ele também considera, por igual, todas as perspectivas dos participantes.
A maioria das técnicas de facilitação existentes, por mais que procurem considerar a opinião e contribuição de todos os presentes, não conseguem garantir que a contribuição de todos seja igualmente considerada. O LSP consegue essa proeza!
Em todas as etapas de um workshop LSP, todos os participantes são conduzidos em construir os seus modelos e contar suas histórias sobre esse modelo. O facilitador ajuda a explorar as nuances e possibilidades de cada modelo, fazendo com que todo o grupo consiga visualizar a compreender o que cada um do grupo pensa.
Esse conjunto de modelos da imagem acima mostra as diferentes visões dos desafios que os integrantes de uma ONG enxergavam para o futuro. Nesse momento estávamos trabalhando em unir as diferentes visões e elaborar uma visão conjunta do grupo e assim poder trabalhar em possíveis caminhos e soluções.
Sabe quando você fica queimando seus neurônios para resolver um problema, ou quando uma equipe fica patinando em algo indefinidamente? Esse é o efeito de fazermos parte desse problema e não conseguirmos interromper o loop.
Quem é fumante (como eu já fui um dia) sabe que às vezes, na hora do cigarrinho, é quando vem aquele insight. Às vezes até saímos propositadamente para fumar em busca desse “alivio criativo”. E se você não fuma, certamente já encontrou soluções enquanto estava cantando no chuveiro, ou passeava com os cachorros, ou estava simplesmente deitado na cama se preparando para dormir.
Tudo isso parte da mesma ideia de “concentrar-se em outra coisa”. E o Lego Serious Play já faz isso por natureza! A própria metodologia nos leva a concentrar-mos em outra coisa.
Como? Quando usamos peças, modelos, metáforas e histórias já estamos vendo as situações de uma outra ótica. O simples fato de montar um modelo para responder uma questão nos tira do loop de causa e efeito. Podemos visualizar a questão, falar sobre ela e até apalpá-la, manipulá-la. Isso é muito poderoso.
O modelo acima, capturado em um estágio mais avançado do workshop, onde estudávamos as conexões entre os elementos foi resultado do desafio “Criar um bar super badalado” que propusemos a um grupo de amigos para testar o poder do Lego.
Os diferentes backgrounds dos participantes do workshop nos trouxe uma visão de muitas perspectivas diferentes. Tínhamos, por exemplo, uma profissional da educação, que acabou agregando uma visão muito interessante de alguém de fora do contexto bar / badalado.
Isso é algo equivalente a técnicas de design thinking onde incluímos informações de contextos diferentes para potencializar o processo criativo.
Nesse tópico eu diria que o Lego não tem uma contribuição direta pensando na metodologia em si, mas pode ser bem explorado pelo facilitador.
Aqui dizemos que a inovação não vem apenas de se criar algo totalmente novo, mas também de usar e combinar o que já foi feito no passado ou em outros contexto.
Em uma dinâmica com Lego Serious Play podemos, por exemplo, modelar diferentes soluções existentes e compreender como elas podem ser combinadas em uma nova solução. Faríamos, assim, uma aplicação incrível dessa diretriz, aproveitando todo o potencial criativo do grupo.
Nesse modelo estávamos trabalhando em como melhor conectar a capacidade ociosa das Universidades e comunidade científica com as necessidades de organizações, um contexto consequencia das mudanças nas relações de ensino.
Aqui pudemos combinar diferentes possibilidades vindas de quem está no meio acadêmico e de quem está no meio empresarial para chegar em soluções combinadas que aproveitassem o melhor, muitas vezes até já conhecido, dos dois mundos.
Outro ponto que não seria nativo do LSP, mas que pode ser abordado de forma magnífica com ele é a diretriz 5, de considerar a dependência de contexto. Não é porque uma solução funcionou em um lugar ou época que ela funcionará para gente.
Eu costumo dizer que não é porque riram da minha piada em sala de aula que a minha piada é boa. De repente eu posso contar a mesma piada em um almoço de família e dar tudo errado! Não é que a piada é boa, é que naquele contexto e naquele momento ela funcionou.
Eu vejo dois pontos que o Lego ajuda a explorar o contexto:
Ao longo da facilitação em si, os modelos, metáforas e histórias nos ajudarão a elaborar o contexto do problema que estamos tratando. Aliás um modelo completo montado em um workshop vai representar todos os elementos do sistema em contexto.
Mas também podemos usar modelos para criar contextos. Um workshop Lego Serious Play é feito de perguntas, e podemos inserir uma etapa específica de contextualização. As possibilidades são infinitas.
Nesse modelo estávamos explorando um SWOT em cima de um modelo de relações entre diferentes áreas. Eu gosto muito de aplicar o SWOT para contextualizar um modelo de sistemas, e podemos aplicar outras técnicas de contextualização usando os elementos do Lego.
No exemplo, cada participante adiciona elementos do SWOT ao modelo para podermos ter uma ampla contextualização interna e externa do sistema.
Protoripação, MVP, experimentacão! É disso que estamos falando na sexta diretriz do Pensamento Complexo. E aqui o Lego dá um baile, por vários motivos:
Ele nos possibilita imaginar e visualizar as possibilidades
Ele nos permite testar as soluções
Ele nos permite mudar e adaptar novas possibilidades
Um modelo completo feito com Lego e seu kit de conexões simula a relação entre diferentes elementos de um sistema complexo. Com esse modelo conseguimos simular o impacto de pequenas mudanças, de novos elementos ou elementos removidos.
O modelo Lego ajuda todo o time a visualizar essa mecânica e entender as dinâmicas e impactos antecipando muito do que pode acontecer no mundo lá fora.
E o que é melhor! De forma totalmente segura e controlada! O pior que pode acontecer é fazermos todo o nosso modelo ruir, o que pode ser triste, mas já mostraria a fragilidade do nosso modelo.
E o prejuízo nem é tão grande porque sempre costumamos registrar em fotos os modelos construídos.
O modelo acima pode ser considerado como um protótipo. Nessa foto ele já está bastante avançado e foram aplicadas as peças do Kit Connections, que possibilita conectar os elementos do modelo para compreender a relação entre eles.
O interessante desse kit é que podemos “testar” o modelo e avaliar mudanças e impactos nos elementos. É como prototipar e testar essas situações. Uma aplicação incrível da ideia de “antecipar, explorar e adaptar”.
Quando você executa uma ação, quanto mais rápido você puder ver e avaliar o resultado dela, mas rápido você aprende. Isso facilita a adaptação e sobrevivência em um mundo complexo.
No Scrum utilizamos os Sprints para tentar forçar um ciclo curto de feedback (apesar de muitas empresas falharem terrivelmente nisso). Com o Lego, muitas coisas podem trazer feedback imediato, durante a execução do workshop.
A formação do grupo que irá participar do workshop é muito importante, e trazer as pessoas certas, que poderão acelerar os ciclos de feedback, é um diferencial. Isso também contribuirá com a diretriz 2, porque a escolha dos participantes irá definir quais diferentes perspectivas teremos em jogo.
E essa escolha também pode potencializar a diretriz número 3, através da participação de pessoas que sejam de outros contextos e domínios, permitindo ver o sistema de perspectivas externas a ele.
Acima você pode ver que são três imagens envolvendo os mesmos modelos. Aqui estávamos estudando a configuração de diferentes narrativas em relação a um sistema que estávamos desenhando.
Isso é um jeito rápido de visualizar as narrativas e poder decidir qual delas faz mais sentido para trabalhar. É uma análise em grupo de como os elementos do sistema se relacionam.
Essa diretriz é muito interessante e útil, inspirada em um conceito da Toyota que está presente até como um princípio do SAFe (Scaled Agile Framework): Nº 3 Presumir variabilidade; preservar as opções.
Esse principio trata da abordagem “Baseada em pontos” (Point-Based) em contra ponto a abordagem “Baseada em conjunto” (Set-Based Design – SBD). É um pouco desafiador explicar isso em aula, e ainda mais aqui em texto.
Mas em resumo, a ideia tem a ver com adiar decisões. Nos projetos em geral, muitas decisões importantes são tomadas no início, quando temos menos informações sobre ele. E ficamos reféns dessas decisões no longo prazo. O ideal é considerar um conjunto de possíveis caminhos, e decidir (ou descartar opções) a medida que avançamos no aprendizado.
O Lego Serious Play pode ser usado como uma ferramenta para auxílio na tomada de decisões, mas não requer que tomemos decisões definitivas. Ele é muito mais uma proposta de visualizar diferentes caminhos e facilitar a opção por um deles.
É comum em um workhsop de Lego que todos os modelos e etapas sejam fotografados, assim conseguimos considerar opções que foram elaboradas ao longo do processo. Podemos ter um verdadeiro “dossiê” ao final do processo que nos ajudará no futuro a aplicar essa diretriz e poder adaptar nossas soluções.
No modelo acima estávamos visualizando diferentes áreas dentro de uma mesma gerência executiva para avaliar como elas poderiam trabalhar em sinergia e colaboração para vencer os desafios.
Esse modelo foi bastante interessante porque foi um cenário bastante complexo e com muitos caminhos e possibilidades. Com o Lego foi possível materializar o sistema e estudar diferentes alternativas e abordagens. Saímos com alguns caminhos possíveis a serem considerados. A partir desse modelo é possível gerenciar essas opções e trabalhar a diretriz número 8 em cima delas.
Vivemos em um mundo complexo onde as relações de causa e efeito não são claras. Uma pequena mudança no sistema pode cauxar um impacto inesperado em um ponto do sistema que sequer imaginávamos.
Esse mundo requer o uso de abordagens que possibiltem navegar na complexidade e agir de forma experimentativa. É importante fazer atividades de sense making e processos criativos de solução de problemas.
Sensemaking ou sense-making é o processo pelo qual as pessoas dão significado às suas experiências coletivas
O Guia do Pensamento Complexo do Management 3.0 e o Lego Serious Play são duas ferramentas muito boas para esse fim. Nesse artigo exploramos o uso conjunto dessas duas abordagens.
Um workshop de Lego Serious Play pode explorar todo o guia do pensamento complexo de uma forma lúdica e poderosa. Problemas complexos podem ser abordados de maneira leve e divertida, com resultados efetivos.
Na Agilers acreditamos tanto no poder do Lego Serious Play que estamos inserindo a metodologia em nossos workshops Management 3.0 Foundation. As próximas turmas já vão contar com atividades usando o Lego –> https://agilers.com.br/produto/management-3-0-foundation-workshop/
E quem quiser levar um workshop personalizado para sua empresa, veja aqui como funciona a metodologia -> lp.agilers.com.br/lsp